segunda-feira, 9 de julho de 2012

História da vida real

A vida de Seu Sebastião não tem sido fácil. Ele tem 46 anos e mora em uma casinha simples, de apenas um cômodo, no bairro Rosele, em Araçatuba. Estudou até a primeira série do Ensino Fundamental e mal sabe escrever o próprio nome. Já tinha ouvido falar dele. Na semana passada, quando esteve em meu programa de rádio, a coordenadora da Ecotenda, Clariana Zanutto, havia me falado sobre a história de Seu Sebastião.

Seu Sebastião vive neste cômodo, no bairro Rosele
No domingo, quando estive no projeto, tive a oportunidade de conhecê-lo. Vi de perto o que é viver na extrema pobreza. A casa dele, na verdade, é apenas uma construção inacabada. Dentro dela, apenas o que cabe. Uma cama simples, uma dispensa praticamente vazia, um guarda roupa com poucas peças, uma televisão com defeito e um radinho pequeno. O telhado danificado justifica as marcas de infiltração pelas paredes. “Tudo o que tenho é ganhado”, disse Seu Sebastião.

"Tudo o que tenho é ganhado", disse Seu Sebastião
Não eram nem 11 horas da manhã e já era possível notar sinais de embriaguez. Infelizmente, ele não consegue deixar o vício sozinho. “Tem pessoas que debocham de mim”, revelou. Durante a nossa conversa, ele me disse que os irmãos o ignoram pelo fato de ser alcoólatra. “Mas eu vou parar de beber, tenho fé. Minha vida vai ser outra”, acredita.

Durante todo o tempo, me chamava de “patrão”, “senhor” e “cidadão”. Mostrou dificuldade para guardar o meu nome. Abriu a carteira quando perguntei o nome dele completo. Quis me mostrar o RG. Foi neste momento, que um cigarro caiu de dentro dela. Imediatamente, o pegou e disse: “Não quero mais saber disso”. E jogou no quintal.

Perguntei ao Seu Sebastião quanto ele tinha na carteira para passar o domingo. Abriu novamente e pegou as moedinhas: R$ 0,70. Disse que era para tomar mais uma dose, mas me garantiu que não faria isso. Falei pra ele: “Esqueça a bebida, Seu Tião”. A comida que ele tem de vez em quando é doada por vizinhos. Quando não, recebe uma cesta básica da Prefeitura.

Seu Sebastião mostra a dispensa quase vazia
Como vive em apenas um cômodo, ele não tem sequer um banheiro. Decidiu improvisar um no meio do quintal. Para tomar banho, ele usa um balde. Todos os dias, esquenta a água em um fogãozinho que ele mesmo montou e se vira como pode. Os voluntários da Ecotenda disseram que vão construir um banheiro para Seu Sebastião ter um pouco mais de privacidade. As obras devem começar em breve.

Este é o banheiro improvisado no quintal da casa dele
Este é o fogão improvisado que Seu Sebastião usa
A bebida está destruindo a vida de um homem que tem consciência disso. Ele sabe que sozinho não pode parar. Maior que a força de vontade dele é a má companhia de pessoas que não estão nem aí para o problema. Muitas vezes, o ser humano é assim: indiferente. É aquela velha história do “se não é comigo, que se dane o resto”.

Fiquei quase uma hora conversando com o Seu Sebastião. Enquanto ele respondia às minhas perguntas, eu pensava numa série de coisas. Sabia que quando chegasse em casa, por exemplo, a mesa do almoço estaria pronta. Enquanto ele, assim que eu virasse as costas, iria para um bar. Outra coisa que me chamou a atenção foi a confiança que ele teve em mim. Não me conhecia e mesmo assim permitiu que eu entrasse na casa dele e o enchesse de perguntas.

Seu Sebastião vive uma situação de extrema pobreza
Ao me despedir, já no quintal daquela casa simples, Seu Sebastião olha pra mim e diz: “Vamos fazer uma oração em casa?”. Fiquei alguns segundos calado e respondi: “Claro, vamos!”. Sem graça, pedi a ele que me desse um minuto para chamar uma colega que me ajudaria na missão. Corri e gritei a Renatinha. Ela foi comigo até a casa e rezou pela vida dele. Era nítida a inquietação dele. Parecia estar perturbado. No final da oração, os olhos dele estavam cheios de lágrimas. “Estou emocionado”, revelou.

Quando fui embora, apenas disse: “O senhor precisa parar de beber e largar o cigarro. Tem que querer ser ajudado”. Saí de lá com a promessa dele de que abandonaria os vícios. Mas sabia que isso era da boca pra fora. Tanto que voltando pra casa passei em frente a um bar e o vi sentado com um garrafa de cerveja. Apenas pensei: “Ele está doente e precisa de ajuda”.

6 comentários:

Thiago Vasconcelos disse...

Impossível ler seu texto e não se emocionar com a história do Sr. Sebastião. Uma vida sofrida e muito triste! Mesmo com tudo isso, ainda te convidou para uma oração..impressionante!
Agora...parabéns pelo texto. Muito bom, incrível como consegue colocar aqui, todas as emoções sentidas durante essa rápida conversa.
Lendo..parece que estou no local, acompanhando tudo da maneira que descreve. Parabéns! Estarei sempre acompanhando aqui, meu amigo!
Abraço!

cleberdacruz disse...

Mais uma vez um texto maravilhoso. Impactante!
É incrível ver a história do Seu Tião contada de uma forma tão clara e emocionante!
Oro hoje tanto pela vida do Seu Tião, quanto pela sua vida, Lucas!
Parabéns!
Abraços!!!

Lucas Matheus disse...

Olá, Thiago! Obrigado por sua visita ao blog. Fiquei bastante impressionado com o que presenciei. É a vida como nunca tinha visto antes. Obrigado pelo apoio, cara! Abraço.

Lucas Matheus disse...

Cléber, mais uma vez, obrigado pela visita ao blog. Que bom que vc gostou do texto! Seu Tião precisa muito de ajuda. Agradeço suas orações. Grande abraço, boa semana! Volte sempre.

clariana zanutto disse...

Lucas...esse texto me emocionou e além disso, me fortaleceu e ainda pensei: vale a pena continuar! É tão bom saber q existem pessoas como vc q tb se sensibilizam c esta triste realidade de nosso país! Olha q legal o q diz este versículo: "Mas os pobres nunca serão esquecidos, nem se frustrará a esperança dos necessitados" (Salmos 9:18).
Parabéns pelo texto!!

Lucas Matheus disse...

Clariana, muito obrigado por sua visita aqui no blog. E por favor: não desista. Aliás, incentive e motive cada vez mais os voluntários da Ecotenda. Pessoas como Seu Sebastião precisam muito de vocês. Sábio versículo. Abração!